A esclerose lateral amiotrófica e outras doenças do neurônio motor caracterizam-se por degeneração contínua, inexorável e progressiva dos tratos corticoespinhais, das células dos cornos anteriores, dos núcleos motores bulbares ou uma combinação. A gravidade dos sintomas varia e pode incluir fraqueza e atrofia muscular, fasciculações, labilidade emocional e fraqueza dos músculos respiratórios. O diagnóstico envolve estudos de condução nervosa, eletromiografia e exclusão de outras doenças por meio de RM e exames laboratoriais. O tratamento é de suporte.
A esclerose lateral amiotrófica (ELA) é a doença do neurônio motor (DNM) mais comum. DNMs podem envolver o sistema nervoso central, assim como o sistema nervoso periférico. Em geral, a etiologia é desconhecida. A nomenclatura e os sintomas variam de acordo com a parte mais afetada do sistema motor.
As miopatias têm características semelhantes, mas são doenças das membranas musculares, do aparelho contrátil ou das organelas.
As DNMs podem ser classificadas como superiores ou inferiores; algumas (p. ex., ELA) apresentam características de ambas. DNMs são mais comuns em homens e aparecem com mais frequência na faixa dos 50 anos.
Sinais e sintomas da ELA e outras DNMs
As DNMs superiores (p. ex., esclerose lateral primária) afetam os neurônios do córtex motor, que se estendem até o tronco encefálico (tratos corticobulbares) ou medula espinal (tratos corticospinais). Em geral, os sintomas consistem em rigidez, atitude desajeitada e movimentos estranhos, normalmente afetando a boca, a garganta ou ambas e se estendendo para os membros.
As DNMs inferiores afetam as células do corno anterior da medula ou seus axônios eferentes para os músculos esqueléticos. Nas paralisias bulbares, apenas os núcleos dos nervos motores cranianos no tronco encefálico (núcleos bulbares) são afetados. Os pacientes geralmente apresentam fraqueza facial, disfagia e disartria.
Quando as células do corno anterior dos nervos (não cranianos) da medula são afetados, como nas atrofias musculares espinhais, os sintomas geralmente incluem fraqueza muscular e atrofia, fasciculações (contrações musculares visíveis) e cãibras musculares, inicialmente nas mãos, nos pés ou na língua. A poliomielite, uma infecção enteroviral que acomete as células do corno anterior e a síndrome pós-pólio, também é uma DNM inferior. Os achados físicos ajudam a diferenciar as DNMs superiores e inferiores (ver tabela Diferenciando a lesão do neurônio motor superior e inferior) e as fraqueza decorrente de DNMs inferiores das causadas por miopatia (ver tabela Diferenciando a causa da fraqueza muscular: disfunção do neurônio motor inferior versus miopatia). TABELA Diferenciação entre lesões do neurônio motor superior e do inferior
TABELA Diferenciação entre as causas de fraqueza muscular: disfunção do neurônio motor inferior versus miopatia*
Esclerose lateral amiotrófica (ELA)
A maioria dos pacientes com ELA apresenta sintomas aleatórios assimétricos, consistindo em cãibras, fraqueza e atrofia muscular nas mãos (mais comum) ou nos pés. A fraqueza progride para os antebraços, ombros e membros inferiores. Fasciculações, espasticidade, reflexos tendinosos profundos hiperativos, reflexos extensores plantares, atitude desajeitada, rigidez do movimento, perda ponderal, fadiga e dificuldade em controlar a expressão facial ou os movimentos da língua ocorrem logo a seguir.
Outros sintomas incluem rouquidão, disfagia e fala arrastada e frequentemente nasal; como é difícil engolir, a salivação parece aumentar e os pacientes tendem a se engasgar com líquidos.
Na fase tardia da doença ocorrem excessos de risos ou choro inapropriados, involuntários e incontroláveis. Sistemas sensoriais, consciência, cognição, movimentos oculares voluntários, função sexual, esfíncteres urinários e anais geralmente são poupados.
A morte geralmente é causada por insuficiência dos músculos respiratórios; 50% dos pacientes morrem dentro de 3 anos do início, 20% vivem 5 anos e 10% vivem 10 anos. A sobrevida > 30 anos é rara.
Paralisia bulbar progressiva e paralisia pseudobulbar progressiva
Os músculos bulbares inervados pelos nervos cranianos são predominantemente afetados, resultante da degeneração progressiva dos neurônios motores que inervam a musculatura bulbar. Esse transtorno causa dificuldade progressiva para deglutir, engolir e falar; voz anasalada; redução do reflexo faríngeo; fasciculações e fraqueza dos movimentos dos músculos faciais e da língua; e fraqueza do movimento palatal. Aspiração é um risco.
O equivalente ao neurônio motor superior dessa doença é a paralisia pseudobulbar progressiva. Essa doença afeta o trato corticobulbar, alcançando os neurônios motores bulbares inferiores, mas poupa os neurônios motores inferiores no tronco encefálico, causando fraqueza dos neurônios motores superiores dos músculos bulbares. e, portanto, é chamada pseudobulbar. A fala é espástica, os pacientes não conseguem repetir rapidamente sílabas (kakaká, tatata, lalala, bababa); o reflexo faríngeo e o reflexo mandibular são vigorosos. Também pode ocorrer um afeto pseudobulbar com labilidade emocional.
Comumente, a paralisia bulbar progressiva se dissemina, afetando segmentos extrabulbares; é então denominada variante bulbar da ELA.
Os pacientes com disfagia apresentam um prognóstico muito precário, e as complicações respiratórias associadas à aspiração resultam em morte em 1 a 3 anos.Atrofia muscular progressiva
Em vários casos, em especial nos que se iniciam na infância, a herança é autossômica recessiva. Outros casos são esporádicos. A doença pode ocorrer em qualquer idade.
Ocorre envolvimento isolado das células do corno anterior, ou é mais proeminente que o envolvimento corticoespinhal, e a progressão tende a ser mais benigna que em outros DNM.
As fasciculações podem ser as primeiras manifestações. A perda da musculatura e a fraqueza significativa começam nas mãos e progridem para braços, ombros e pernas, acabam se tornando generalizadas. Os reflexos tendinosos profundos são hipoativos. Os pacientes podem sobreviver ≥ 25 anos.
Dicas e conselhos
Suspeitar de ELA ou outra doença do neurônio motor nos pacientes com características de disfunção do neurônio motor superior e/ou inferior (p. ex., respostas extensoras plantares junto com atrofia e fasciculação).
Esclerose lateral primária
Na esclerose lateral primária, ocorre rigidez muscular progressiva nos membros superiores e inferiores, com espasticidade e hiperreflexia durante o exame. Fasciculações e atrofia muscular são típicas dessa doença predominantemente do neurônio motor superior. A sobrevida é prolongada porque o risco de aspiração e pneumonia é baixo; são necessários vários anos até que haja incapacidade total.
Diagnóstico da ELA e outras DNMs
Exames eletrodiagnósticos
RM cerebral e, se não houver envolvimento de pares cranianos, da coluna cervical
Exames laboratoriais para avaliar outras causas tratáveis
O diagnóstico das doenças neuronais motoras é sugerido pela fraqueza motora progressiva, generalizada, sem anomalias sensoriais relevantes.
Diagnóstico diferencial
Outras doenças neurológicas que causam fraqueza muscular pura devem ser excluídas:
Distúrbios da transmissão neuromuscular
Várias miopatias (incluindo não inflamatórias e induzidas por fármacos)
Atrofia muscular espinhal (principalmente em crianças)
Polimiosites
Dermatomiosite
Doenças tireoidianas e doenças adrenais
Anormalidades de eletrólitos (p. ex., hipopotassemia, hipercalcemia, hipofosfatemia)
Várias infecções (p. ex., sífilis, doença de Lyme, hepatite C)
Neuropatias motoras autoimune-mediadas
Estenose espinal cervical
Variante comportamental da demência frontotemporal (15 a 20% desenvolvem doença do neurônio motor)
Toxicidade por metais pesados (p. ex., chumbo, mercúrio)
Quando os pares cranianos são afetados, uma causa secundária tratável é menos provável. Sinais de lesão de neurônio motor superior e inferior associados à fraqueza dos músculos faciais sugerem fortemente esclerose lateral amiotrófica.
Dicas e conselhos
Quando os pares cranianos são afetados, e os resultados são compatíveis com ELA, uma causa secundária tratável é menos provável.
Exames
Testes eletrodiagnósticos devem ser realizados para verificar evidências de doenças de transmissão neuromuscular e desmielinização. Essas evidências não estão presentes em DNM; a velocidade de condução nervosa geralmente é normal, até tardiamente na evolução da doença. EMG com agulha é o exame mais útil, mostrando fibrilações, ondas positivas, fasciculações e, às vezes, unidades motoras gigantes, mesmo nos membros não afetados.
A RM do cérebro é necessária. Quando não há evidências clínicas ou EMG da fraqueza motora do nervo craniano, indica-se RM da coluna cervical para excluir lesões estruturais que podem estar comprimindo a medula espinal.
Os testes laboratoriais são realizados para identificar causas tratáveis. Esses exames incluem hemograma completo, eletrólitos, creatinoquinase (CK) e exames de função tireoidea.
Eletroforese das proteínas do soro e da urina, com imunofixação, é efetuada para verificar uma paraproteína que raramente está associada com DNMs. A descoberta de uma paraproteinemia de base pode indicar que o DNM é paraneoplásico e o tratamento da paraproteinemia pode melhorar o DNM.
Anticorpos de glicoproteína associada à antimielina são associados com uma neuropatia motora desmielinizante, a qual pode se assemelhar à esclerose lateral amiotrófica. A coleta de urina de 24 horas é realizada para verificar a presença de metais pesados em pacientes que podem ter sofrido exposição a eles.
Punção lombar pode ser feita para excluir outras doenças clinicamente suspeitas; se os níveis de leucócitos ou proteínas estão elevados, um diagnóstico alternativo é provável.
O exame sérico de ventrículo direito RL (serum Venereal Disease Research Laboratories, VDRL), velocidade de hemossedimentação e sorologias (fator reumatoide, títulos para doença de Lyme, anti-HIV, vírus da hepatite C, AAN e anti-Hu [para avaliar síndrome anti-Hu paraneoplásica]) só são indicados se sugeridos por fatores de risco ou pela anamnese.
Testes genéticos (p. ex., para mutações do gene da superóxido dismutase e anormalidades genéticas que causam atrofias musculares espinais) e medições enzimáticas (p. ex., hexosaminidase A para doença de Tay-Sachs) não devem ser realizados, a menos que os pacientes estejam interessados em aconselhamento genético; as doenças detectadas por esses testes não têm tratamento específico conhecido.
Tratamento da ELA e outras DNMs
Cuidados de suporte
Riluzole
Edaravona
A base do tratamento para pacientes com esclerose lateral amiotrófica é a intervenção oportuna para tratar os sintomas.
A abordagem com equipe multiprofissional auxilia o paciente a enfrentar a incapacidade neurológica progressiva.
Nenhum fármaco oferece benefício clínico substancial para os pacientes com ELA. Entretanto, o riluzol pode proporcionar melhoria limitada da sobrevida (2 a 3 meses) e a edaravona pode retardar o declínio da função até certo ponto.
As seguintes fármacos podem ajudar a reduzir os sintomas:
Para a espasticidade, baclofeno
Para cãibras, quinina ou fenitoína
Para reduzir a produção de saliva, fármacos anticolinérgicos potentes (p. ex., glicopirrolato, amitriptilina, benztropina, triexifenidil, hioscina transdérmica, atropina)
Para aspecto pseudobulbar, amitriptilina, fluvoxamina ou uma combinação de dextrometorfano e quinidina
A cirurgia para melhorar a deglutição tem sucesso limitado em pacientes com paralisa bulbar progressiva.
Pontos-chave
Considerar doença de neurônio motor em pacientes com fraqueza motora superior e/ou inferior difusa sem alterações sensoriais.
Suspeitar de ELA em pacientes com sinais de lesão do neurônio motor superior e inferior associados à fraqueza dos músculos faciais.
Fazer RM do cérebro e testes laboratoriais e eletrodiagnósticos para excluir outros doenças.
A base do tratamento consiste em medidas de suporte (p. ex., apoio multidisciplinar para ajudar a lidar com a deficiência; tratamento medicamentoso para sintomas como espasmos, cólicas e aspecto pseudobulbar).
Contudo, em pacientes com ELA, o riluzol pode fornecer benefícios limitados de sobrevida, e a edaravona pode retardar o declínio da função.
Por
, MDCM, New York Presbyterian Hospital-Cornell Medical Center
Avaliado clinicamente abr 2022