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Lúpus Eritematoso Sistêmico



1 - O QUE É LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO?

O Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) é uma doença inflamatória crônica, sistêmica, de etiologia multifatorial, que acomete vários órgãos ou sistemas. Caracteriza-se pelo desequilíbrio do sistema imunológico com presença de autoanticorpos dirigidos principalmente contra antígenos nucleares, alguns dos quais participam da lesão tecidual imunologicamente mediada. Embora tenha um grande predomínio em mulheres em idade fértil, ou seja, entre 15 e 45 anos, sugerindo a influência de fatores hormonais sexuais, o LES pode acometer indivíduos de ambos os sexos e de diversas faixas etárias, sendo também mais comum em certos grupos étnicos, como afroamericanos, asiáticos e hispânicos, conforme demonstrado na tabela 1. Existe um variado espectro de apresentação clínica, tem evolução crônica, com fases de exacerbações e períodos de remissões. Por exemplo, alguns pacientes podem ter um predomínio de envolvimento cutâneo e articular, enquanto outros podem apresentar com acometimento orgânico mais grave, como nefrite ou hemorragia alveolar difusa.


2 - QUAL A PATOGENIA DO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?


O LES é caracterizado por vários defeitos no sistema imune por perda de autotolerância, que resulta em um processo que começa na quebra da homeostasia celular e culmina com a produção anormal de autoanticorpos, cujo aparecimento precede em anos os primeiros sintomas da doença.

Entre os distúrbios da regulação imune, destacam-se: aumento da expressão de IFN-alfa, especialmente durante os períodos de atividade inflamatória; redução do número e função das células T citotóxicas e supressoras em paralelo ao aumento do número e atividade dos linfócitos T CD4+ (helper) e ativação policlonal de células B autorreativas; múltiplas anormalidades na sinalização linfocitária, incluindo hiper-reatividade, decorrente dos defeitos determinados genética ou epigeneticamente; defeitos de tolerância dos linfócitos B, relacionados aos defeitos na apoptose e deficiência de complemento; aumento da expressão de BLyS/BAFF, gerando redução da apoptose das células produtoras de autoanticorpos e aumento da ativação dos toll-like receptors (TLR) e dos níveis de IFN-alfa; defeitos na sinalização entre as células T e B, com consequente redução da expressão de IL-2 e do número de células T regulatórias; redução do clareamento dos imunocomplexos circulantes e do material apoptótico pelos macrófagos; aumento da sinalização dos TLR7 e TLR9 nas células B, dendríticas e plasmáticas; e aumento do processo conhecido como NETose, que é uma forma de apoptose específica dos neutrófilos e que libera uma “rede” composta por DNA ligado a proteínas e que é capaz de estimular a produção de IFN-alfa e anti-DNA, por meio da ação do TLR9. Não se conhecem as causas que ocasionam as anormalidades imunológicas, mas admite-se que deve haver uma interação entre múltiplos genes (que conferem susceptibilidade à doença) e fatores ambientais. Os imunocomplexos podem se depositar nos tecidos levando à resposta inflamatória e lesão tecidual, causando as manifestações clínicas que dependem do tecido acometido. Por sua vez, a lesão tecidual liberaria mais autoantígenos favorecendo a perpetuação da resposta autoimune.

3 - QUAL A ETIOLOGIA DO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?


Embora ainda não completamente esclarecida, a etiologia do LES é multifatorial com participação de fatores genéticos, epigenéticos, hormonais, ambientais e imunológicos. Agentes infecciosos (como o Epstein-Barr vírus, citomegalovírus e Mycobacterium tuberculosis), algumas drogas (procainamida, hidralazina, hidrazida, etc.), radiação ultravioleta (luz solar) e fatores hormonais (aumento da relação estrógeno/andrógeno) são alguns dos fatores reconhecidos como possíveis desencadeantes da doença.

O papel patogênico dos hormônios baseia-se na hipótese da imunomodulação. Os estrógenos têm papel estimulador de várias células imunes, como macrófagos, linfócitos T e B. Nesse sentido, favorecem a adesão dos mononucleares ao endotélio vascular, estimulam a secreção de algumas citocinas, como interleucina-1 e expressão de moléculas de adesão e MHC. Do mesmo modo, a via de IFN do tipo 1 é regulada positivamente pelo estrogênio e negativamente pelos progestágenos. Os estrogênios também têm uma ação semelhante às moléculas de BLyS/BAFF, reduzindo a apoptose de células autorreativas e acelerando sua maturação, especialmente das células B com alta afinidade pelo DNA. Entre os fatores ambientais, é importante ressaltar o papel da luz ultravioleta (UV). A exposição solar determina a apoptose de queratinócitos com subsequente secreção de citocinas (IL-1, IL-6, TNF-alfa, GM-CSF) com amplificação da resposta imune, além de promover a ativação de macrófagos e processamento de antígenos, o que desencadeia uma resposta inflamatória sistêmica. O tabagismo, que é o segundo fator ambiental mais associado ao desenvolvimento de LES, também reduz os efeitos terapêuticos da hidroxicloroquina, um dos principais medicamentos empregados no tratamento do lúpus.


4 - QUAIS AS EVIDÊNCIAS DA PARTICIPAÇÃO GENÉTICA NO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?


Do ponto de vista genético, é bem conhecida uma alta prevalência da doença entre gêmeos monozigóticos (29 vezes maior que a da população geral) e nos parentes de primeiro grau (risco 17 vezes maior de desenvolver LES). Outros estudos em gêmeos mostram concordância para LES em 24% a 58% nos monozigóticos, contra 2% a 5% nos dizigóticos; havendo também maior prevalência de anticorpos antinucleares em familiares (mesmo assintomáticos) de pacientes com LES. Estudos de famílias com múltiplos casos de LES sugerem a existência de haplótipos associados a maior suscetibilidade à doença. A associação de LES com outras doenças reconhecidamente genéticas, como a deficiência de componentes do sistema de complemento, como C1q, C2 e C4, é outra evidência que aponta à participação genética. A deficiência genética de C1q é muito rara, entretanto, mais de 90% dos indivíduos com esse gene de forma homozigótica desenvolvem LES. Até o momento, não há um único gene de suscetibilidade associado ao LES, mas os estudos mais recentes mostram que há várias regiões de cromossomos que contêm genes de suscetibilidade para essa doença. Estudos recentes de avaliação genômica (genome-wide association studies), identificaram cerca de 50 loci com polimorfismos relacionados a uma maior predisposição. Além dos genes predisponentes, como TREX1 e DNAse1, é consistente a associação com alguns alelos do MHC (major histocompatibility complex) com o LES, principalmente os alelos DR2 e DR3 de classe II. Outras associações importantes estão relacionadas à assinatura de interferon (IFN). Genes ligados à imunidade inata, como STAT4, IRF5, TLR7 entre outros, estão ligados à sinalização e produção de IFN-alfa que tem sua expressão aumentada no soro de 60-80% dos pacientes. Parece que a ação aditiva de múltiplos genes confere maior suscetibilidade, mas também é importante a exposição a fatores ambientais. Além disso, há diversas linhagens de camundongos com alterações sugestivas de lúpus humano, entre as quais a mais conhecida e estudada é o cruzamento da linhagem NZB (New Zeland Black) e NZW (New Zeland White). A prole F1 (NZB X NZW) desenvolve anticorpos antinucleares anti-DNA nativo e falecem de insuficiência renal secundária a glomerulonefrite, sobretudo a do sexo feminino. Esse modelo experimental de lúpus destaca a importância da genética nessa doença.

5 - QUAL A INCIDÊNCIA E A PREVALÊNCIA DO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?


Os estudos epidemiológicos apresentam dados variáveis quanto à incidência e prevalência do lúpus. Nos Estados Unidos, a prevalência é de 124 por 100.000 e a incidência é de 1,8-7,6 por 100.000 por ano. No Brasil, estima-se uma incidência aproximada de 4,8 a 8,7 casos por 100.000 habitantes por ano. Trata-se de uma doença universal encontrada em todas as etnias e nas mais diferentes áreas geográficas, mas parece ser mais prevalente em afrodescendentes. As características da doença e sua gravidade bem como sua prevalência podem diferir em diversos grupos étnicos.

6 - POR QUE O LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES) INCIDE PREFERENCIALMENTE EM MULHERES?

As doenças autoimunes, em geral, acometem mais mulheres do que homens. A análise da incidência do LES nas diferentes faixas etárias em ambos os sexos mostra claramente que a doença incide principalmente nas mulheres em que há maiores níveis de hormônios femininos, entre os 15 e 45-50 anos de idade. Aumento da atividade da doença durante a gravidez e os relatos de casos de LES após uso de pílulas anticoncepcionais à base de estrógenos são algumas das evidências da participação de estrógenos nessa doença. Estudos com dosagens hormonais demonstraram níveis significativamente maiores de 16-hidroxiestrona e estriol em mulheres com LES do que em controles saudáveis. Níveis mais baixos de andrógenos também foram relatados em mulheres com LES, principalmente em fase ativa da doença. Além disso, estudos experimentais em F1 (NZB X NZW) com castração das fêmeas mostraram que o desenvolvimento da doença autoimune era postergada e a sobrevida aumentada, demonstrando nítida influência dos hormônios femininos como facilitadores da resposta autoimune nesse modelo animal.



7 - O QUE É LÚPUS INDUZIDO POR DROGAS (LID) E QUAIS AS DROGAS MAIS FREQUENTEMENTE IMPLICADAS NESSE TIPO DE LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?

O lúpus induzido por drogas é um subgrupo de pacientes que desenvolveram lúpus após exposição a um medicamento e cujas manifestações clínicas e laboratoriais desaparecem com a suspensão do mesmo. Nos EUA, estima-se que 10% dos casos de LES sejam induzidos por drogas. Embora muitas dezenas de drogas tenham sido descritas como possíveis indutoras de lúpus, muitas são apenas descrições de associação temporal esporádicas. As drogas que mais frequentemente causam o aparecimento de autoanticorpos e menos frequentemente ocasionam sinais e sintomas clínicos. Os principais medicamentos associados ao desenvolvimento de lúpus estão listados na tabela 2.

Pacientes com LID apresentam menor frequência de comprometimento renal e neurológico e, geralmente, a pesquisa de anticorpos antinucleares mostra padrão homogêneo de fluorescência, com identificação de apenas um tipo de autoanticorpo, que é dirigido principalmente contra a histona.



8 - QUAIS AS MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS MAIS FREQUENTES DO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?


O LES é uma doença crônica, que evolui com períodos de atividade e períodos variados em que os pacientes ficam assintomáticos ou pouco sintomáticos. O comprometimento de diversos órgãos ou sistemas pode ocorrer de forma simultânea ou sequencial. Os comprometimentos mais frequentemente observados em pacientes com LES são:

  • cutâneo: lesão em vespertílio, fotossensibilidade;

  • lúpus cutâneo subagudo ou lesão discoide;

  • articular: artralgia ou artrite;

  • de serosas: pericardite ou pleurite;

  • hematológico: leucopenia ou linfopenia;

  • alterações do sedimento urinário, que podem ocorrer em mais de 50% dos pacientes, ao longo da evolução da doença.

As queixas constitucionais como adinamia, mal-estar, fadiga, perda de peso e/ou febre também são frequentemente observadas na fase ativa da doença. A febre pode ser baixa e contínua ou alta, em picos, e deve ser diferenciada de infecção intercorrente. A fadiga é uma queixa muito frequente e inespecífica. A coexistência de fibromialgia deve ser lembrada em pacientes com fadiga e dor difusa que não apresente outros sinais ou sintomas, nem alterações laboratoriais sugestivos de doença ativa. A perda de peso em pacientes com LES ativo geralmente é leve, contudo alguns casos de acentuado emagrecimento foram descritos, denominado caquexia lúpica. Linfadenopatia generalizada ou localizada, com predomínio das cadeias cervical e axilar, pode ser observada em mais de um terço dos casos, assim como a presença de hepato e/ou esplenomegalia. 9 - COMO SE FAZ O DIAGNÓSTICO DE LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?


O diagnóstico de LES baseia-se na presença de manifestações clínicas características e de exames laboratoriais. Critérios para classificação dos indivíduos com lúpus foram estabelecidos pelo Colégio Americano de Reumatologia (ACR) em 1971 e revisados em 1982 e em 1997, e estão apresentados na tabela 3. Qualquer combinação de 4 ou mais dos 11 critérios, bem documentados em qualquer momento da evolução da história do indivíduo, torna muito provável o diagnóstico, com especificidade e sensibilidade de 95% e 75%, respectivamente. A revisão de 1997, realizada por Hochberg, modificou os critérios: a presença das células com lúpus eritematoso (LE) foi retirada devido à dificuldade técnica da realização do exame, e acrescentou-se a positividade para os anticorpos antifosfolípides, mantendo-se nesse item a reação sorológica falso-positiva para sífilis. Esses critérios não são específicos do LES, e outras doenças podem preenchê-los, como a sífilis, a hanseníase, a síndrome da imunodeficiência adquirida e a síndrome do anticorpo antifosfolípide. Eles foram definidos para identificar uma população relativamente homogênea e para permitir comparação entre grupos de pacientes em diferentes centros de pesquisa.




10 - O QUE SÃO OS CRITÉRIOS SLICC PARA CLASSIFICAÇÃO DE LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?


Um grupo internacional de profissionais especializados em atendimento de pacientes com lúpus, Systemic Lupus International Collaborating Clinic (SLICC), publicou nova proposição para os critérios de classificação dos pacientes. Foram incluídas manifestações do lúpus não contempladas nos critérios do ACR e foi enfatizada a necessidade de preenchimento de, pelo menos, um critério imunológico. Para um indivíduo ser classificado como portador de lúpus é necessário o preenchimento de pelo menos 4 critérios, incluindo pelo menos 1 clínico (dentre 11) e 1 imunológico (dentre 6), ou deve ter nefrite confirmada por biópsia na presença de fator antinuclear positivo ou anticorpo anti-DNA nativo positivo (tabela 4). O novo critério apresentou especificidade de 92% e sensibilidade de 94%.



11 - COMO AVALIAR A ATIVIDADE DA DOENÇA NO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?


A atividade da doença é avaliada por meio da combinação de história clínica, exame físico, testes funcionais específicos e estudos sorológicos. Sua quantificação pode ser de grande importância para o acompanhamento dos pacientes, tanto na prática clínica quanto nos estudos clínicos. Existem vários índices de atividade de doença: SLEDAI (Systemic Lupus Erythematosus Disease Activity Index), e suas versões (SELENA-SLEDAI e SLEDAI-2K), SLAM (Systemic Lupus Activity Measure), BILAG (British Isles Lupus Assessment Group), ECLAM (European Consensus Lupus Activity Measurement), todos elaborados para uma monitorização mais acurada da atividade inflamatória. O Systemic Lupus International Colaborating Clinics/American College of Rheumatology – Damage Index (SLICC-ACR) é um escore útil para medir o grau de sequela verificando os danos cumulativos decorrentes do LES e/ou de sua terapêutica, como insuficiência renal crônica, quadros vasculares (infarto agudo do miocárdio, AVC), diabetes mellitus, osteoporose com fraturas, osteonecrose, entre outros.

12. QUAIS AS CARACTERÍSTICAS DO COMPROMETIMENTO ARTICULAR NO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)? A atrite de pequenas articulações das mãos, dos punhos e dos joelhos frequentemente é simétrica, costuma ter caráter intermitente e é relatada em 60-70% dos pacientes ao longo da evolução da doença. Em 10% a 15% dos casos, a artrite pode ter evolução crônica, mas, caracteristicamente, não cursa com erosões ósseas. O comprometimento de tecidos periarticulares pode causar deformidades articulares, que quando reversíveis são denominadas artropatia de Jaccoud. Alguns pacientes desenvolvem artropatia erosiva, com fator reumatoide positivo, sendo classificados como síndrome de superposição entre LES e artrite reumatoide, denominada rhupus, por alguns autores.

Queixas articulares, principalmente em ombros, quadril e joelhos, também podem ser causadas por necrose óssea avascular, encontrada em cerca de 10% a 22% dos casos e que geralmente ocorre em múltiplos sítios e está associada à atividade da doença e ao uso de corticosteroides em altas doses no ano anterior ao do diagnóstico de osteonecrose.



13. QUE TIPO DE COMPROMETIMENTO CUTÂNEO O LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES) PODE CAUSAR? Lesões cutâneas ocorrem em cerca de 80% dos pacientes com LES ao longo da evolução da doença. Lesão em asa de borboleta ou vespertílio (50-60%) é caracterizada por ter início agudo, ser eritematosa, com localização em regiões malares e dorso do nariz. Outras lesões agudas são as lesões eritematomaculares, papulares ou maculopapulares, e as lesões bolhosas, também de localização preferencial em áreas expostas ao sol. As lesões do tipo lúpus cutâneo subagudo são pápulas eritematosas ou pequenas placas, de aspecto anular ou policíclico, lembrando eritema anular centrífugo ou as lesões da psoríase. Ocorrem em cerca de 7-27% dos pacientes, principalmente nas áreas expostas ao sol e habitualmente associam-se ao anticorpo anti-Ro (SSa). As lesões crônicas (discoides) ocorrem em 15-30% dos casos e costumam iniciar como pápulas ou placas eritematosas, que evoluem tornando-se espessadas e aderidas, com hipopigmentação central. Com a progressão da lesão, ocorre formação de rolha folicular, com cicatriz e atrofia central, acompanhadas de alterações discrômicas. Elas se localizam preferencialmente em áreas expostas ao sol como a face, região do decote, dorso e membros superiors, além do pavilhão auricular. As úlceras orais são indolores e observadas no exame físico em 25% dos casos. A alopecia difusa pode ser identificada em até 50% dos casos e se relaciona com maior atividade da doença.

A fotossensibilidade tem ocorrência variada (40-60%) e é muito frequente no Brasil. Outras lesões cutâneas podem ocorrer no LES, mas não são específicas da doença, têm menor frequência e incluem: lesões do tipo bolhosas, urticariformes, lesões pernióticas e vasculíticas. O fenômeno de Raynaud pode ser a primeira manifestação da doença e está correlacionado com a presença dos anticorpos anti-RNP.




14. QUAIS OS TIPOS HISTOPATOLÓGICOS DA NEFRITE LÚPICA? O envolvimento renal é caracterizado, segundo os critérios do American College of Rheumatology, pela presença de proteinúria acima de 0,5 g/24 horas e/ou cilindrúria anormal. Alteração do sedimento urinário e/ou proteinúria ocorre em cerca de 50% dos pacientes, ao longo da evolução da doença. Estima-se que cerca de 10% dos pacientes com glomerulonefrite proliferativa evoluam com insuficiência renal terminal após 5 anos, mesmo com tratamento adequado. O pior prognóstico é observado nas glomerulonefrites com componente proliferativo. A maioria dos autores utiliza a classificação histológica proposta pela International Society of Nephrology e pela Renal Pathology Society (tabela 5). Além do tipo histológico, é importante saber se a lesão renal é ativa, portanto, passível de tratamento, ou crônica e irreversível: Índices de atividade:

  • hipercelularidade endocapilar;

  • infiltrado leucocitário;

  • necrose fibrinoide/cariorrex;

  • crescentes celulares;

  • depósito hialinossubendotelial;

  • infiltrado intersticial.

Índices de cronicidade:

  • esclerose glomerular;

  • crescente fibrosa;

  • fibrose intersticial;

  • atrofia tubular.

Cada variável recebe escore zero (ausente) a 3, sendo que crescente celular e necrose/cariorrex são pontuadas em dobro. Dessa maneira, o escore máximo de atividade é 24 e o máximo de cronicidade é 12. A hipertensão arterial é uma complicação frequente, sendo encontrada em cerca de 40% dos pacientes.




15. QUAIS SÃO OS FATORES ASSOCIADOS A PIOR PROGNÓSTICO RENAL NA NEFRITE LÚPICA?

Os fatores associados a pior prognóstico renal na nefrite lúpica são a presença de síndrome nefrótica, alto índice de cronicidade, hipocomplementemia, classe IV, anemia e hipertensão arterial. Cor negra e idade menor que 20 anos por ocasião do diagnóstico são descritos por alguns autores, mas não há consenso sobre associação deles com pior prognóstico renal. 16. QUAIS ALTERAÇÕES CLÍNICAS OU LABORATORIAIS SÃO INDICATIVAS DE PIOR PROGNÓSTICO EM PACIENTES COM NEFROPATIA LÚPICA? Os trabalhos mostram que pacientes de cor negra, ou mestiços, têm pior prognóstico do que pacientes de cor branca, sugerindo possível influência genética. Entretanto, também foi demonstrado que baixo nível socioeconômico e de escolaridade estavam associados à pior prognóstico da nefrite lúpica, assim como o sexo masculino e idade mais jovem ao início do comprometimento renal. Outros preditores de pior prognóstico em pacientes com nefrite lúpica incluem:

  • Aumento de creatinina;

  • Síndrome nefrótica;

  • Hipertensão arterial persistente;

  • Hematócrito baixo;

  • Hipocomplementemia;

  • Não remissão do quadro de nefrite após o primeiro ano de tratamento.

17. QUAIS SÃO AS MANIFESTAÇÕES HEMATOLÓGICAS QUE PODEM OCORRER EM PACIENTES COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)? A maioria dos casos de anemia no LES é do tipo normocrômica e normocítica, sendo atribuída à doença crônica e à atividade inflamatória da doença. Em menos de 15% dos casos a anemia é do tipo hemolítica autoimune, podendo ser mais grave. Leucopenia e linfopenia são referidas em mais de 50% dos casos, ao longo da evolução da doença. Plaquetopenia grave, com menos de 30 mil plaquetas/mm3 ocorre em menos de 10% dos casos. As plaquetopenias crônicas podem ser decorrentes da presença de anticorpos antifosfolípides e, geralmente, não costumam causar sangramento. Muito raramente, pancitopenia pode ocorrer por aplasia medular devido a mecanismos imunológicos. Devemos lembrar que pancitopenia também pode ser devido aos efeitos colaterais de drogas ou a infecção viral intercorrente. 18. QUAIS AS POSSÍVEIS MANIFESTAÇÕES DECORRENTES DO ENVOLVIMENTO DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL EM PACIENTES COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?

O envolvimento do sistema nervoso central no lúpus é bastante pleiomórfico e ocorre em 24% a 59% dos casos. A grande variabilidade na porcentagem destas manifestações deve-se a diferentes métodos empregados para sua identificação, por exemplo, a disfunção cognitiva leve é referida em mais de 70% quando se aplicam questionários mais sensíveis. A cefaleia pode ter diversas etiologias e para ser considerada causada pelo LES deve ser intensa, não responsiva a analgésicos de ação central e melhorar após corticoterapia. O Colégio Americano de Reumatologia propôs uma nomenclatura padronizada para a classificação de 19 manifestações neuropsiquiátricas, descritas na tabela 6. Essas condições são subdivididas em sistema nervoso central e periférico, e podem ser atribuidas ao LES desde que afastadas outras causas, principalmente infecções e distúrbios metabólicos. São observadas em 25 a 70% dos pacientes, podendo ser a primeira manifestação da doença e ocorrer mesmo na ausência de outras manifestações.





19. QUAIS AS MANIFESTAÇÕES CARDÍACAS QUE O LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES) PODE CAUSAR?

Pacientes com LES podem apresentar pericardite, miocardite e endocardite. Mais raramente pode haver vasculite de coronárias. Lembramos também que pacientes com LES apresentam aterosclerose mais frequente e mais precoce do que a população geral. A pericardite é a manifestação mais comum, ocorrendo em cerca de 50% dos casos, ao longo da evolução da doença, mas pode ser assintomática em muitos casos. Muito raramente causa derrame pericárdico e tamponamento (< 1%). A miocardite é uma das manifestações mais graves no LES e se apresenta por taquicardia, distúrbios de condução, dispneia e aumento de área cardíaca, mas pode ser subclínica em muitos casos. Alterações valvares por espessamento de folhetos e a presença de vegetações verrucosas (endocardite de Libman-Sacks) estão associadas à presença de anticorpos antifosfolipídios e, raramente, podem levar à disfunção valvar. Doença arterial coronariana acomete mulheres com LES mais precocemente que mulheres da população geral. O risco de doença arterial coronária chega a ser 50 vezes maior em mulheres com LES, na faixa dos 35 a 44 anos de idade, segundo um estudo norte-americano. 20. COM RELAÇÃO AO COMPROMETIMENTO PULMONAR, O QUE O LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES) PODE CAUSAR?

As manifestações pulmonares do LES podem ser agudas ou crônicas. A pleurite é a mais comum de todas, ocorrendo em 30% a 60% dos casos e pode manifestar-se por dor torácica, atrito pleural e até derrame pleural, que geralmente é de pequeno volume, mas que pode ser muito grande, necessitando drenagem. As manifestações pulmonares agudas mais graves são a pneumonite e a síndrome de hemorragia alveolar. Na pneumonite aguda, o paciente apresenta tosse, dispneia, febre e, ocasionalmente, hemoptise, além de infiltrado ou condensação pulmonar à radiografia, o que torna difícil o diagnóstico diferencial com pneumonia bacteriana. A síndrome de hemorragia alveolar, secundária à capilarite pulmonar, evolui com hemoptise e dispneia, até insuficiência respiratória e é geralmente fatal, caso não seja tratada agressiva e precocemente. Felizmente essa última manifestação é bastante rara. A pneumopatia crônica com fibrose pulmonar apresenta evolução indolente e manifesta-se por dispneia progressiva e tosse. A síndrome do pulmão encolhido é secundária à diminuição de volumes pulmonares, sem alteração de parênquima e geralmente não apresenta sintomas. A embolia pulmonar geralmente está associada à presença de anticorpos antifosfolipídios, mas a hipertensão pulmonar pode ocorrer independente do histórico de embolia pulmonar.

21. O LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES) PODE COMPROMETER ÓRGÃOS ABDOMINAIS?

O comprometimento abdominal pode ocorrer em raros casos, devido à vasculite, causando pancreatite, vasculite mesentérica ou isquemia intestinal. Hepatomegalia é descrita em 10% a 30% e esplenomegalia em 20% dos pacientes com a doença em atividade. Inflamação aguda do peritônio pode causar dor abdominal e ascite asséptica, podendo muito raramente evoluir com peritonite crônica. As queixas de epigastralgia em pacientes com LES são devidas, mais frequentemente, à gastrite medicamentosa. 22. O LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES) PODE CAUSAR COMPROMETIMENTO GANGLIONAR? Aumento de linfonodos pode ser encontrado em cerca de 40% dos pacientes com LES em atividade. Geralmente há acometimento de múltiplos gânglios, com linfoadenomegalia discreta, indolor e não aderente, ocorrendo em região cervical ou axilar. Eventualmente, pode ocorrer adenomegalia importante, podendo cursar com necrose inflamatória central não caseosa. A biópsia é impositiva nesses casos, para se fazer o diagnóstico diferencial com causas infecciosas como tuberculose ganglionar, com doença linfoproliferativas e com sarcoidose.

23. QUAL COMPROMETIMENTO VASCULAR PODE SER ENCONTRADO EM PACIENTES COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)? O fenômeno de Raynaud é referido em 20% a 40% dos casos e geralmente ocorre na fase ativa da doença. Geralmente ocorre em extremidades, sobretudo nas mãos e pés. Processo inflamatório acometendo a parede arterial (vasculite) em pacientes com LES costuma ocorrer em capilares, arteríolas e artérias de pequeno calibre, afetando sobretudo mucosa oral ou nasal e polpas digitais. Vasculite acometendo artérias de médio calibre podem ocorrer mais raramente e ocasionam úlceras isquêmicas, necrose digital ou isquemia visceral. Lembramos que as isquemias cutâneas ou viscerais também podem ser decorrentes de fenômenos tromboembólicos, devido a anticorpos antifosfolípides, na ausência de inflamação vascular. A vasculite de coronárias é uma ocorrência muito rara. Na maioria dos pacientes com LES e coronariopatia isquêmica, a lesão coronária deve-se à aterosclerose, mesmo em indivíduos jovens. 24. QUAIS EXAMES SUBSIDIÁRIOS DEVEM SER SOLICITADOS EM PACIENTE COM SUSPEITA DE LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?

Além dos exames imunológicos, como anticorpo antinuclear, anticorpo antifosfolípides e dosagem de complemento, nos pacientes com suspeita clínica de LES, deve-se solicitar hemograma com contagem de plaquetas e exame de urina, pois os comprometimentos hematológico e renal muitas vezes não causam alteração ao exame clínico, sendo diagnosticados com esses exames. Em avaliação de pacientes com LES em fase ativa da doença, além desses exames, é necessário se fazer avaliação da função renal e hepática. Nos pacientes com proteinúria, é interessante fazer sua quantificação, com a proteinúria de 24 horas e dosagem de albumina sérica.

A velocidade de hemossedimentação, geralmente, está elevada em pacientes com processo inflamatório sistêmico, mas, é um exame inespecífico e pode estar normal em pacientes com atividade restrita a determinados órgãos. A proteína C reativa geralmente está pouco elevada ou normal em pacientes com LES em atividade. Quando muito elevada, obriga-nos a procurar infecção intercorrente. Os principais exames complementares úteis no diagnóstico e acompanhamento dos pacientes estão na tabela 7. Os exames de imagens e testes funcionais como eletrocardiograma, ecocardiograma, radiografia de tórax, tomografia computadorizada, ressonância nuclear magnética cerebral, eletroneuromiografia, exame do líquido cefalorraquidiano, e outros devem ser solicitados na suspeita de comprometimento dos órgãos a serem examinados.

25. QUAL O VALOR DE UM EXAME DE ANTICORPO ANTINUCLEAR POSITIVO?

Anticorpo antinuclear (AAN) pesquisado por imunofluorescência indireta, utilizando células HEp2 como substrato, é positivo em cerca de 95% a 98% dos pacientes com LES em fase ativa da doença. Entretanto, esse anticorpo não tem especificidade, podendo ser positivo em diferentes porcentagens em muitas outras doenças reumáticas como a artrite reumatoide, a síndrome de Sjogren, a doença mista do tecido conjuntivo e a esclerose sistêmica. Além disso, é positivo em diversas outras doenças autoimunes como na tiroidite de Hashimoto e na hepatite autoimune e até em indivíduos normais.

26. QUAL A DIFERENÇA DA PESQUISA DE ANTICORPO ANTINUCLEAR POR IMUNOFLUORESCÊNCIA INDIRETA E POR ELISA? QUAL MÉTODO É MELHOR?

Tradicionalmente a pesquisa de AAN é feita por imunofluorescência, mas o exame deve ser feito por examinador afeito à técnica e com experiência. A técnica de ELISA tornou a pesquisa menos dependente do examinador, entretanto, para que se possa valorizar o resultado, é necessário que o substrato utilizado seja puro, livre de contaminações. A técnica de ELISA aumentou muito a sensibilidade, mas o teste perdeu em especificidade. 27. QUAIS AUTOANTICORPOS SÃO CONSIDERADOS ESPECÍFICOS DO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?

Anticorpos anti-DNA nativo

Pesquisado por imunofluorescência indireta tendo como substrato a Crithidia luciliae, ou pela técnica de FARR, é considerado específico para LES, entretanto sua sensibilidade é baixa (50% a 60% em doença ativa). O uso de técnica de enzimaimunoensaio (ELISA) tem maior sensibilidade, mas menor especificidade, pois depende do kit utilizado. Anticorpos anti- DNA- nativo são considerados um dos parâmetros de atividade do LES. Anticorpos anti-Sm Pesquisados por imunodifusão dupla ou hemaglutinação também são considerados específicos do LES, mas sua sensibilidade é de apenas 30%. A técnica de ELISA também aumentou sua sensibilidade, mas diminuiu a especificidade. Anticorpo anti-p ribossomal e anti-PCNA Também são considerados específicos do LES, mas sua prevalência é muito baixa (menos de 10%). 28. O QUE SÃO ANTICORPOS ANTINUCLEOSSOMOS E QUAIS OS SEUS VALORES?

Nucleossomo é uma estrutura que faz parte da cromatina do núcleo da célula, sendo composto por um segmento de DNA, envolvido por octâmero de histonas. Anticorpos antinucleossomos têm sensibilidade de 86% e especificidade 95% para LES. Alguns estudos demonstraram que os níveis séricos de anticorpos antinucleossomos flutuam de acordo com a atividade da doença, especialmente em pacientes com nefrite lúpica. Como eles são mais prevalentes que anticorpos anti-DNA nativo, têm se tornado um novo marcador imunológico do LES, auxiliando no diagnóstico e também na monitoração de atividade da doença. 29. QUAL O SIGNIFICADO DA HIPOCOMPLEMENTEMIA EM PACIENTES COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)? A dosagem do complemento sérico pode auxiliar no monitoramento da atividade do LES. Em fases da atividade da doença, observa-se consumo do complemento e consequente diminuição dos níveis de componentes da via clássica (p. ex. C2, C4) e da via alternativa (p. ex. C3), que se normalizam quando a doença entra em remissão. A dosagem do complemento também auxilia na diferenciação entre atividade renal e pré-eclâmpsia em gestante com LES, pois nessa última os níveis séricos de complemento são normais. Deficiência geneticamente determinada de componentes do complemento é rara, mas é uma das condições associadas a maior predisposição para o desenvolvimento de LES ou de uma síndrome lúpus-símile. As deficiências de complemento mais frequentemente associadas ao LES são de C1q, de C2 e de C4. Essa condição deve ser suspeitada quando o paciente persistir com níveis baixos de apenas uma das frações do complemento, apesar da doença estar em fase inativa. Embora a deficiência de C1q seja muito rara, pacientes com essa deficiência de forma homozigótica têm chance de mais de 90% de desenvolver LES. 30. QUAL O TRATAMENTO PARA O LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES), DE UM MODO GERAL? O tratamento do LES deve abordar orientações gerais que incluem também a educação do paciente sobre a doença e sua evolução. É importante frisar que o tratamento adequado, na grande maioria dos casos, permite uma vida longa, produtiva e com boa qualidade. Um seguimento médico periódico, com boa aderência ao tratamento, é muito importante para a evolução da doença e seu prognóstico. É recomendado que a doença seja tratada por médicos com experiência e exigirá a participação de uma equipe multidisciplinar de diversas especialidades – médicas, psicológicas, fisioterapêuticas e farmacêuticas–, além de uma estrutura de apoio hospitalar e de investigação complementar. Orientações gerais - Proteção solar

Evitar exposição solar, usar protetor solar com FPS maior que 15. Mais importante do que utilizar bloqueadores solar com alto fator de proteção é o hábito de repassar o protetor, cuja ação não protege o paciente por mais do que três ou quatro horas. Dieta Balanceada e rica em cálcio, para prevenção de osteoporose, dislipidemia e obesidade. Restrição calórica é importante para pacientes com sobrepeso e principalmente quando em uso de altas doses de corticosteroides. Nesses casos, a diminuição de ingestão de sal pode diminuir a retenção hídrica devido à ação dos corticosteroides. Atividade física Pode ser necessária sua restrição em pacientes na fase muito ativa da doença. Após o controle da fase inflamatória, deve-se estimular atividade física regular, para melhorar o condicionamento cardiovascular, manter o trofismo muscular e prevenir a diminuição da massa óssea e o desenvolvimento de doenças cardiovasculares. Tabagismo Evitar ou eliminar o tabagismo. Tratamento adequado de hipertensão arterial Os inibidores da enzima conversora da angiotensina são os anti-hipertensivos de eleição, desde que não haja contraindicação para seu uso. Glicemia Controle rigoroso da glicemia nos pacientes com hiperglicemia, para prevenir doença cardiovascular. Tratamento de dislipidemia Se as medidas dietéticas e o exercício não conseguirem controlar a dislipidemia, deve-se adicionar estatinas, mantendo níveis de LDL-c, se possível, abaixo de 100 mg/dl. 31. QUAIS AS BASES DO TRATAMENTO MEDICAMENTOSO NO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?

O tratamento medicamentoso deve ser avaliado para cada paciente e dependerá dos órgãos ou sistemas acometidos, assim como da gravidade desses acometimentos. A medicação deverá ser orientada para o tratamento do comprometimento mais grave. É muito importante o diagnóstico diferencial ou de concomitância de processo infeccioso A pedra angular no tratamento de todos os pacientes com LES é o uso de antimaláricos, preferencialmente a hidroxicloroquina, que deve ser prescrita desde o diagnóstico, independentemente da gravidade da doença. Os benefícios desse agente já foram amplamente demonstrados, incluindo melhora clínica consistente, níveis mais baixos de atividade, reativações menos frequentes, redução da dose dos corticosteroides, melhor resposta no tratamento da nefrite nos estudos com micofenolato de mofetil (MMF), menor frequência de manifestações neurológicas e de danos permanentes, além de menor mortalidade. Trabalhos mostram também um efeito adicional benéfico dos antimaláricos no controle da dislipidemia (o uso concomitante de antimalárico diminui a hipercolesterolemia que costuma ocorrer com o uso de corticoesteroides), além da ação antiagregante plaquetária que pode ser mais relevante em pacientes com anticorpos antifosfolípides positivos, que apresentam maior tendência à hipercoagulabilidade. A baixa adesão a esse medicamento pode ocorrer por receio de maculopatia, complicação muito rara e improvável para indivíduos com função renal normal e período de uso inferior a 7 anos. O acompanhamento oftalmológico segue os recomendados pela Academia Americana de Oftalmologia em 2016. 32. QUAL O TRATAMENTO PARA AS LESÕES CUTÂNEAS DO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)? Lesões cutâneas localizadas podem ser tratadas com corticosteroides tópicos associados aos antimaláricos (4 mg/kg/dia de difosfato de cloroquina ou 6 mg/kg/dia de hidroxicloroquina). Deve-se evitar corticosteroides fluorados em face, devido à possibilidade de atrofia cutânea. Como a retinopatia pela hidroxicloroquina é menos frequente do que com a cloroquina, esta é a medicação preferencial. Entretanto, a cloroquina tem menor custo, razão pela qual continua sendo muito utilizada em nosso meio. Infiltrações com corticosteroides podem ser feitas quando as lesões forem pouco extensas e não disseminadas. Nas lesões muito exuberantes, ou quando não houver resposta aos antimaláricos, utiliza-se prednisona em doses menores que 0,5 mg/kg/dia. Nos pacientes com lesões cutâneas refratárias a essa terapêutica, podem ser utilizados o metotrexato (10 a 15 mg/semana), azatioprina (1-2 mg/kg/dia) ou talidomida (100-200 mg/dia, permitida somente em pacientes sem qualquer risco de gravidez). Outra opção para pacientes que não podem utilizar antimaláricos é a clofazimina na dose de 100 mg/dia. A dapsona (100 mg/dia) pode ser prescrita a pacientes com lesões bolhosas devido ao lúpus. O manejo dessas drogas requer o conhecimento dos possíveis efeitos colaterais e deve ser feito por médico habituado ao seu uso. Evitar exposição à luz ultravioleta e a utilização de fotoprotetores são obrigatórios. 33. COMO TRATAR A ARTROPATIA DO LÚPUS?

A artrite pode ser tratada com anti-inflamatórios não hormonais (AINH) ou inibidores específicos de COX-2, desde que não haja contraindicação para seu uso. Evitar o uso desses medicamentos em pacientes com nefrite e hipertensão arterial ou com comprometimento da função renal. Nos casos não responsivos, pode-se utilizar prednisona em doses baixas (7,5 a 15 mg/dia). Em pacientes com artrite crônica ou artrite recidivante, deve-se utilizar antimaláricos ou metotrexato, para poupar corticosteroides. Nas monoartrites ou oligoartrites crônicas, a infiltração intra-articular com triancinolona hexocetonida tem mostrado bons resultados. É neces sário lembrar que o comprometimento articular em pacientes com LES pode ser causado por necrose óssea asséptica ou infecção, situações que necessitam de outras terapêuticas. Embora a artrite do lúpus não cause erosões, o comprometimento de ligamentos e cápsulas pode levar a deformidade e incapacidade importante em alguns pacientes. Frouxidão ligamentar também pode estar associada ao uso de corticosteroides.

34. QUAL O MELHOR TRATAMENTO PARA A NEFRITE LÚPICA?

O maior desafio para o tratamento da nefrite lúpica é sua identificação precoce e de suas reativações, aspectos claramente associados à maior chance de remissão. Os protocolos padronizados incluem variações de acordo com a gravidade da lesão e decisão compartilhada com os pacientes, e estão organizados em forma de algoritmo nas figuras 1 e 2. Em pacientes com glomerulonefrite proliferativa lúpica com comprometimento da função renal, o tratamento com ciclofosfamida na forma de pulsoterapia ainda é considerado a melhor opção terapêutica. A imunossupressão deve ser mantida por tempo prolongado (pelo menos 1 ano após controle do processo inflamatório), pois o uso por tempo curto está associado a maior chance de recidiva. Em razão dos efeitos colaterais do uso crônico de ciclofosfamida, há diversos estudos propondo indução de remissão da nefrite com ciclofosfamida e manutenção com drogas imunossupressoras menos agressivas, como a azatioprina ou o micofenolato mofetil. Pacientes cujo comprometimento renal não seja acompanhado de perda de função renal e com maiores riscos de efeitos colaterais, sobretudo a infertilidade, podem, alternativamente, serem tratados desde o início com micofenolato mofetil na dose de 2 a 3 g/dia. Para os pacientes que não tiverem obtido resposta completa ou parcial em 6 meses de indução com algum esquema de ciclofosfamida ou MMF, deve-se considerer a troca de um pelo outro ou a substituição por um inibidor de calcineurina ou ainda o rituximabe. Os inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA) e/ou bloqueadores dos receptores de angiotensina (BRA) são recomendados como antiproteinúricos para todos os pacientes (exceto quando contraindicados). Deve-se estimular uma dieta com restrição de sal, mais rica em cálcio. Suplementação de vitamina D deve ser considerada para a manutenção de níveis adequados. O tratamento desses casos deve ser feito por especialista, habituado ao uso dessas drogas e ao tratamento de pacientes com nefrite lúpica, pois mesmo tratados adequadamente 10% a 15% destes pacientes evoluem com perda definitiva da função renal.


35. QUAL O MELHOR TRATAMENTO PARA AS MANIFESTAÇÕES NEUROPSIQUIÁTRICAS?

O tratamento das manifestações neuropsiquiátricas se fundamenta nos resultados obtidos em poucos estudos controlados que compararam ciclofosfamida aos corticosteroides isoladamente e a administração intravenosa mensal da ciclofosfamida em esquema de doses elevadas foi superior ao uso isolado de corticoide.

36. QUAIS SÃO AS NOVAS ALTERNATIVAS MEDICAMENTOSAS PARA O TRATAMENTO DO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?

Novas alternativas para tratamento de pacientes com LES têm sido estudadas, especialmente medicamentos imunobiológicos. O belimumabe encontrou resultados positivos em ensaios clínicos randomizados que resultaram na sua aprovação pelas agências regulatórias para uso na prática clínica. Trata-se de um anticorpo monoclonal cujo mecanismo de ação se dá pela ligação ao BLyS (B lymphocyte stimulator) solúvel, impedindo sua ligação ao linfócito B, diminuindo sua maturação, diferenciação e sobrevida. A eficácia do belimumabe não foi avaliada em pacientes com nefrite lúpica ativa grave, nem com lúpus ativo do sistema nervoso central. É contraindicado em pacientes com ideação suicida. Deve ser utilizado na dose de 10 mg/kg nas semanas 0, 2 e 4 e após cada 4 semanas em associação ao tratamento padrão. O posicionamento desse medicamento no fluxograma de tratamento ainda não está completamente definido, podendo ser recomendado para pacientes que mantêm doença persistentemente ativa (escore SLEDAI > 6), particularmente nos quadros musculoesqueléticos ou cutâneos, mesmo com uso de antimalárico associado com baixas doses de corticoide e falha de pelo menos dois imunossupressores utilizados em doses adequadas por 3-6 meses. Deve ser considerada a descontinuação do belimumabe quando não houver melhora no controle da doença após 6 meses de tratamento. O rituximabe, anticorpo monoclonal quimérico que desencadeia depleção de linfócitos B, é uma medicação bastante utilizada em pacientes com doença grave e refratária. Entretanto, dois ensaios clínicos (Explorer e Lunar) que avaliaram perfis de pacientes com doença moderada a grave com com envolvimento renal e extrarrenal não atingiram seus desfechos clínicos e laboratoriais definidos em protocolo. Porém, ficou evidenciado um papel importante desta medicação no tratamento de pacientes com doença grave e refratária ao manejo convencional, especialmente nos casos com envolvimento renal, mas também musculoesquelético, hematológico, cutâneo e neurológico. Utiliza-se geralmente em ciclos com a dose total de 1.000 mg, intravenoso, tendo cada aplicação um intervalo de 2 semanas. Os ciclos são repetidos a cada 6 meses.

O melhor entendimento da fisiopatogenia do LES tem permitido avanços na descoberta de novas potenciais moléculas que, atuando em determinados eixos do sistema imune, podem ser úteis no melhor controle da atividade da doença. Dentre os novos potenciais alvos, destacam-se os bloqueadores/inibidores do eixo de ativação do interferon, BAFF/APRIL e vias de ativação de céluas T, além de novos medicamentos depletores de linfócitos B e pequenas moléculas que interferem em eixos de sinalização intracelular. 37. QUANDO SE DEVE ENCAMINHAR PACIENTES COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO PARA O REUMATOLOGISTA? Pacientes com LES com manifestações mais leves podem ser tratados por clínicos gerais ou por outros especialistas. Pacientes com comprometimento mais grave de determinado órgão ou sistema pode ser tratado pelo especialista da área, mas é recomendável que também seja acompanhado pelo reumatologista, que tem melhor noção das possíveis complicações que podem surgir, assim como dos efeitos colaterais das drogas necessárias para o manejo da doença. O ideal seria que o reumatologista seguisse esses pacientes e contasse com a colaboração de outros especialistas à medida que forem surgindo comprometimentos mais graves e que venham a necessitar de avaliação ou tratamento específico.

38. POR QUE A GESTAÇÃO EM PACIENTES COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES) DEVE SER CONSIDERADA DE ALTO RISCO?

A gravidez em pacientes com LES deve ser considerada de alto risco pela possibilidade de atividade da doença durante a gestação ou o puerpério, sobretudo se engravidar com a doença em atividade. A gestação de pacientes com LES requer seguimento por profissionais (reumatologistas e obstetras) habituados a tratar esses casos.

A gravidez deve ser contraindicada em pacientes com doença sistêmica ativa, perda da função renal (creatinina > 1,5 mg/dl), hipertensão arterial grave, insuficiência cardíaca ou pulmonar ou comprometimento neurológico grave. Pacientes com comprometimento renal prévio ou com anticorpos antifosfolípides têm risco aumentado de desenvolver doença hipertensiva da gravidez e pacientes com anticorpos anti-Ro/SSA têm maior risco de terem filhos com lúpus neonatal. Pacientes com anticorpos antifosfolípides podem ter abortamentos, retardo do crescimento fetal e óbito intrauterino, devido a menor fluxo sanguíneo para o feto em consequência de trombose ou espasmo de vasos placentários. Feto de baixo peso e prematuridade ocorrem na maioria dos casos de gravidez em mulheres com LES, portanto, um adequado atendimento neonatal é fundamental para o bom prognóstico dos recém-nascidos. 39. QUE MÉTODOS ANTICONCEPCIONAIS SÃO MAIS INDICADOS PARA PACIENTES COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?

O método mais indicado é o de barreira, mas este requer colaboração do parceiro. Para evitar o uso de anticoncepcionais à base de estrógenos, recomenda-se os anticoncepcionais à base de progestágenos. O dispositivo intrauterino está contraindicado em pacientes com plaquetopenia e em uso de altas doses de corticoesteroides e/ou de imunossupressores, devido ao risco de sangramento e de infecção. 40. PACIENTES COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES) PODEM FAZER REPOSIÇÃO HORMONAL? Em um estudo controlado com seguimento de um ano, comparando mulheres com LES com e sem reposição hormonal com estrógeno e progesterone, não foi encontrada diferença significante no número de atividade grave da doença entre os dois grupos. Entretanto, o número de atividade leve e moderada foi significativamente maior no grupo com terapia de reposição hormonal (TRH). Embora pacientes com anticorpos antifosfolípides tenham sido excluídos do estudo, foi observado um óbito, um acidente vascular encefálico e 3 episódios trombóticos no grupo com TRH e apenas um caso de tromboembolismo no grupo controle. Em conclusão, a TRH pode ser prescrita para pacientes com LES controlado e que tenha benefício a ela. Não deve ser prescrita para pacientes com anticorpos antifosfolípides. 41. O QUE É O LÚPUS NEONATAL? O lúpus neonatal é uma síndrome caracterizada por lesões cutâneas, bloqueio cardíaco congênito (BCC) e por outras manifestações menos frequentes, como plaquetopenia e alterações de enzimas hepáticas, que ocorrem em fetos recém-nascidos de mães com anticorpos anti-Ro/SSa e/ou anti-La/SSb e, muito raramente, com anticorpos anti-U1 RNP. Essas mulheres podem ser assintomáticas ou ter diagnóstico de LES, síndrome de Sjogren ou de doença indiferenciada do tecido conjuntivo. Acredita-se que o dano fetal e neonatal seja causado pela passagem transplacentária de anticorpos maternos da classe IgG para a circulação fetal, com consequente lesão mediada por anticorpos. A incidência estimada de BCC em filhos de pacientes lúpicas com anticorpos anti-Ro/SSA varia de 1,5%-25%, em média em torno de 7,2%. O tratamento depende do tipo de lesão. O quadro cutâneo, a trombocitopenia e a anemia hemolítica podem ser tratados com corticoide, na dependência de sua gravidade. O BCC deve ser abordado através do uso de corticosteroides que atravessam a barreira placentária, como a betametasona ou a dexametasona. Os casos refratários requerem implante de marcapasso cardíaco no período neonatal. 42. QUAIS OS EFEITOS COLATERAIS DO USO CRÔNICO DE CORTICOSTEROIDES EM PACIENTES COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES) E COMO MINIMIZAR ESSES EFEITOS?

O uso crônico de corticosteroides causa muitos efeitos colaterais, que dependem da dose e da potência da substância utilizada, da existência de comorbidades e da resposta de cada paciente. Os principais são:

  • estéticos: aumento de peso, estrias, aumento centrípeto de gordura, fácies em “lua cheia”, atrofia cutânea e fragilidade capilar;

  • metabólicos: hiperglicemia, dislipidemia, retenção de sódio e perda de potássio e mais raramente hipocalcemia;

  • ósseo: osteopenia e osteoporose, aumento do risco de necrose óssea avascular, aumento da fragilidade ligamentar e capsular;

  • infecção: aumento de risco de infecções;

  • muscular: miopatia por atrofia de fibras do tipo II;

  • neurológico: labilidade emocional, ansiedade, tremor de extremidades e psicose por corticoide;

  • ocular: catarata subcapsular, aumento da pressão ocular;

  • retenção de líquido e hipertensão arterial;

  • cardíaco: aumento do risco de desenvolver doença aterosclerótica.

43. COMO MINIMIZAR OS EFEITOS COLATERAIS DO USO CRÔNICO DE CORTICOSTEROIDES EM PACIENTES COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)? Para minimizar os efeitos recomenda-se:

  • Dieta hipossódica, com baixo teor de gordura e hipocalórica, quando indicada;

  • Estimular atividade física regular;

  • Reposição de potássio;

  • Controle da dislipidemia com drogas hipolipemiantes, principalmente as estatinas, quando indicado;

  • Cálcio e vitamina D, desde que não haja contraindicação para seu uso;

  • Controle rigoroso de todos os fatores de risco tradicionalmente associados às doenças coronárias;

  • Controle oftalmológico periódico;

  • Controle de densitometria óssea, para tratamento com bisfosfonatos, caso seja constatado osteopenia em paciente usuário crônico de prednisona em dose maior ou igual a 7,5 mg ao dia.

44. QUAIS OS PRINCIPAIS EFEITOS COLATERAIS DOS IMUNOSSUPRESSORES MAIS FREQUENTEMENTE USADOS EM PACIENTES COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)? Os imunussupressores, de modo geral, aumentam o risco de infecções e a maioria causa toxicidade medular. A ciclosporina é o único imunossupressor que não está associado à toxicidade medular, mas pode causar nefrotoxicidade, com aumento dos níveis de creatinina, aumento de pressão arterial, hipertricose e hipertrofia gengival. A ciclofosfamida está associada ao risco aumentado de infertilidade e esterilidade devido à insuficiência gonadal e ao risco de desenvolver cistite hemorrágica, câncer de bexiga e doença linfoproliferativa, sobretudo em pacientes com uso por tempo prolongado e em doses altas. Também pode causar queixa gastrointestinal no dia da aplicação e nos dias subsequentes à aplicação endovenosa. Mais raramente pode ocorrer mucosite e diarreia. O risco de insuficiência ovariana está associado à dose e à idade de pacientes por ocasião do uso de ciclofosfamida. Alterações da espermatogênese são independentes da idade do paciente.

A azatioprina pode causar mielotoxicidade, frequentemente evidenciada por leucopenia, intolerância gastrointestinal, reação alérgica, hepatotoxicidade e mais raramente pancreatite em pacientes com LES. O uso concomitante de alopurinol diminui seu metabolismo, aumentando muito a toxicidade da azatioprina. O uso de imunossupressores deve ser realizado por médicos afeitos ao manejo dos mesmos, conhecedor dos possíveis efeitos colaterais e das condutas para reduzir esses riscos. 45. QUAL A CONDUTA EM PACIENTE COM SÍNDROME ANTIFOSFOLÍPIDE SECUNDÁRIO AO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)? Nos pacientes que apresentam apenas anticorpos antifosfolípides sem histórico de tromboses, orienta-se prevenção primária de eventos trombóticos com ácido acetilsalicílico (100 mg/dia), associado à hidroxicloroquina. Outros fatores de risco para trombose, como fumo, imobilização prolongada, uso de estrógenos, também devem ser evitados ou corrigidos nesse grupo de pacientes. Pacientes que apresentaram trombose venosa, arterial e/ou microangiopatia trombótica devem receber anticoagulante oral por tempo prolongado, ajustando o RNI entre 2-3. Exceção feita para pacientes com acidente vascular cerebral isquêmico, mas sem trombose venosa, nos quais indica-se o uso de ácido acetilsalicílico (325 mg/dia) e tratamento de fatores de risco para doença cardiovascular (p. ex. hipertensão arterial, dislipidemia, tabagismo).

Pacientes com LES e histórico de abortos de repetição, perda fetal ou parto prematuro por pré-eclâmpsia ou eclâmpsia, com anticorpos antifosfolípides que engravidarem, devem receber ácido acetilsalicílico (100 mg/dia) e heparina não fracionada (5.000 UI 12/12 horas) ou heparina de baixo peso molecular. Todavia, aquelas pacientes que já utilizam anticoagulante oral, devem mudar para heparina não fracionada (10.000 UI de 12/12 horas) ou heparina de baixo peso molecular em doses terapêuticas, assim que o teste de gravidez for positivo, pois anticoagulante oral é teratogênico. 46. QUAL O PROGNÓSTICO E QUAL A SOBREVIDA DE PACIENTES COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)?

O prognóstico de pacientes com LES tem melhorado muito nas últimas décadas, uma vez que a sobrevida de 5 anos que era de 50% na década de 1950, passou para 95% nos dias atuais. Estudos publicados na década de 90 mostram sobrevida variando de 88% a 93% em 5 anos e 76% a 85% em 10 anos nos grandes centros de países desenvolvidos. Em uma grande cidade canadense, a sobrevida de 20 anos chegou a 68%. Entretanto, nesse mesmo período, estudos de sobrevida em 5 anos realizados na Índia e em Curaçao mostraram sobrevida estimada em 77% e 56%, respectivamente, mostrando que a sobrevida depende muito da assistência médica oferecida a esses pacientes e/ou de fatores genéticos. No Brasil, devido à heterogeneidade do nível de assistência médica oferecida à população, estima-se que a sobrevida também seja muito variável. O LES de início infanto-juvenil, etnia não caucasiana e baixo nível socioeconômico e de educação formal estão relacionados a um pior prognóstico. A doença com envolvimento cardiovascular, neurológico, renal e plaquetopenia grave, assim como maiores índices de atividade de doença (SLEDAI) e de dano (SLICC/ACR) também estão associados a um pior prognóstico. Por outro lado, antimaláricos mostraram ter um efeito protetor na sobrevida de pacientes com LES, independentemente do grupo étnico e das manifestações clínicas, o que reforça a recomendação de seu uso para todos os pacientes com LES. As causas de óbito nos primeiros 5 anos de doença continuam sendo: atividade de doença, principalmente a renal e a neurológica, e, sobretudo, as infecções intercorrentes. Mesmo em pacientes que falecem devido à infecção, a atividade da doença pode ser um importante fator contribuinte para o óbito e vice-versa. Em pacientes com mais tempo de doença, a aterosclerose vem se tornando importante causa de mortalidade, principalmente em países desenvolvidos, mostrando a necessidade de controlar fatores tradicionalmente associados ao risco de doença coronária, como a hipertensão arterial, diabetes mellitus, obesidade e dislipidemia, sobretudo LDL-c elevado e HDL baixo. Em estudo realizado no estado de São Paulo, analisando atestados de óbitos dos últimos 20 anos, em que constava LES como causa básica de morte, observou-se que 83% dos óbitos ocorreram antes dos 50 anos de idade, mostrando que em nosso meio, infelizmente, essa doença continua causando óbito, principalmente em mulheres jovens. As causas mais frequentes de óbito foram infecção e insuficiência renal, seguidos por doença cardiovascular. Nesse sentido, manter atualizada a carteira vacinal é extremamente importante a fim de reduzir o risco de infecções. Os antimaláricos parecem aumentar as taxas de soroconversão e soroproteção das vacinas dos pacientes, mesmo quando do uso de terapêuticas imunossupressoras. Metanálise recente mostrou que pacientes com LES possuem risco 2,98 vezes maior de óbito quando comparado à população controle. O risco de morte por doença cardiovascular foi 2,7 vezes maior, 4,9 vezes por infecção, e 7,9 vezes maior por insuficiência renal do que população de mesma faixa etária e sexo.

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