Tratamento
Qualquer valva cardÃaca pode se tornar estenosada ou insuficiente (também chamada regurgitante ou incompetente), provocando alterações hemodinâmicas muito antes dos sintomas. Com mais frequência, a estenose ou a insuficiência valvar ocorrem isoladamente em determinadas valvas, mas podem coexistir múltiplas enfermidades valvares e uma mesma valva pode ser estenosada e insuficiente.
Disfunções da valva cardÃaca incluem
Regurgitação aórtica: insuficiência da valva aórtica que causa fluxo reverso do sangue da aorta para o ventrÃculo esquerdo durante a diástole
Estenose aórtica: estreitamento da valva aórtica, obstruindo o fluxo sanguÃneo do ventrÃculo esquerdo para a aorta ascendente durante a sÃstole
Regurgitação mitral: insuficiência da valva mitral que provoca o fluxo do sangue do ventrÃculo esquerdo para o AE durante a sÃstole ventricular.
Estenose mitral: estreitamento do orifÃcio mitral que obstrui o fluxo sanguÃneo do AE para o ventrÃculo esquerdo.
Prolapso da valva mitral: abaulamento das cúspides da valva mitral para o AE durante a sÃstole
Regurgitação pulmonar: insuficiência da valva pulmonar que provoca fluxo sanguÃneo da artéria pulmonar para o ventrÃculo direito durante a diástole.
Estenose pulmonar: estreitamento da via de saÃda pulmonar provocando obstrução do fluxo sanguÃneo do ventrÃculo direito para a artéria pulmonar durante a sÃstole
Regurgitação tricúspide: insuficiência da valva tricúspide, que provoca fluxo sanguÃneo do ventrÃculo direito para AD durante a sÃstole
Estenose tricúspide: estreitamento do orifÃcio tricúspide que obstrui o fluxo sanguÃneo do AD para o ventrÃculo direito
Historicamente, o diagnóstico das valvopatias por observação, palpação e ausculta era um teste desafiador para aspirantes a médicos (1). Hoje, com o exame fÃsico suplementado por ultrassonografia cardÃaca, (incluindo, à s vezes, ultrassonografia portátil feita pelo médico examinador), o diagnóstico é comparativamente simples e direto. Estudos 2-D padrão mostram a anatomia. Ecocardiografia com Doppler avalia os gradientes de pressão e o fluxo sanguÃneo. A avaliação também é feita por ECG (para detectar o ritmo cardÃaco e as alterações das câmaras) e radiografia de tórax (para detectar alterações das câmaras cardÃacas, congestão pulmonar e outras doenças pulmonares).
Referência geral
1. Ma I and Tierney LM: Name that murmur—Eponyms for the astute auscultician. N Engl J Med 363:2164–2168, 2010.
Tratamento
Valvuloplastia ou substituição valvar
O tratamento de uma lesão valvar comumente requer apenas observação periódica, sem nenhum tratamento ativo por muitos anos. Em geral, nem estilo de vida nem fármacos alteram a história natural da lesão valvar. A intervenção só é normalmente indicada quando uma lesão valvar moderada ou grave provoca sintomas ou disfunção cardÃaca. Como os pacientes podem não reconhecer os sintomas devido ao seu inÃcio lento, muitos médicos usam testes de esforço para ajudar a monitorar os pacientes.
A intervenção pode envolver valvoplastia (reparo da valva) ou substituição da valva, todos os quais podem ser realizados de maneira percutânea ou cirúrgica. Atualmente, valvopatias são objeto de intensa pesquisa para desenvolvimento da substituição valvar percutânea.
Além disso, estudos randomizados e controlados de diferentes intervenções valvares estão sendo realizados. O resultado para os pacientes é um número crescente de opções terapêuticas e melhores evidências sobre como escolhê-las. Para os médicos, o aumento da complexidade agora exige uma equipe de valva cardÃaca multidisciplinar composta por cirurgiões, cardiologistas e outros especialistas para ajudar a decidir qual intervenção é melhor para um determinado paciente.
Se a cirurgia de revascularização do miocárdio está sendo realizada, é usual tratar cirurgicamente (durante a mesma operação) quaisquer lesões valvares moderadas ou graves, mesmo que assintomáticas.
A profilaxia da endocardite é indicada quando há uma história de endocardite e para pacientes com valvas cardÃacas protéticas.
Escolha da prótese valvar cardÃaca
Dois tipos de prótese valvar cardÃaca são utilizados:
Bioprotética (porcina ou bovina)
Mecânica (fabricada)
Os dois tipos têm Ãndices semelhantes de sobrevida e de trombose valvar. As próteses mecânicas têm taxas mais altas de complicações hemorrágicas, e as biopróteses têm maior probabilidade de exigirem reintervenção porque se deterioram mais rapidamente do que as válvulas mecânicas.
Em geral, utiliza-se uma valva mecânica (1) em pacientes que não pretendam engravidar e que preencham um ou mais dos seguintes critérios:
Já estão tomando um antagonista da vitamina K (p. ex., para fibrilação atrial) e têm boa adesão terapêutica
Menos de 50 anos (para valva aórtica)
Menos de 65 anos (para valva mitral)
Recomenda-se uma valva bioprotética a fim de substituir a valva aórtica em pacientes > 65 anos. Para pacientes de 50 a 65 anos, as recomendações são apenas orientações, pois as preferências dos pacientes podem mudar, particularmente com base em como eles percebem as complicações do sangramento versus a necessidade de reintervenção.Anticoagulação para pacientes com valva cardÃaca protética
A anticoagulação é necessária para prevenir tromboembolismo. A duração do tratamento e o fármaco utilizado diferem com base no tipo de prótese.
Valva mecânica: é necessária anticoagulação ao longo da vida com um antagonista da vitamina K (AVK) de acordo com os alvos da razão internacional normalizada (RNI) abaixo
Valva bioprotética: é necessário ácido acetilsalicÃlico por toda a vida (pode-se administrar naqueles com baixo risco de sangramento 3 a 6 meses de anticoagulação com uma AVK antes de mudar para ácido acetilsalicÃlico).
Valva aórtica transcateter: ácido acetilsalicÃlico por toda a vida. Pode-se considerar a adição de clopidogrel ou de uma AVK (RNI alvo de 2,5) por 3 a 6 meses após o implante para pacientes com maior risco de trombose.
Anticoagulantes orais de ação direta (ACOAD) são ineficazes para as indicações acima e não devem ser usados.
O RNI alvo para a maioria das próteses mecânicas modernas de dupla válvula é de 2,5, aumentando para 3,0 em caso de algum dos seguintes:
Fibrilação atrial
Fração de ejeção ventricular esquerda (FEVE) < 35%
Posição mitral ou tricúspide
Tromboembolismo prévio
Pacientes que conseguem automonitorar seu RNI (razão internacional normalizada) ou fazer acompanhamento em clÃnicas dedicadas à anticoagulação têm menor variabilidade na RNI e menos eventos adversos.
Se os pacientes têm tromboembolismo apesar de um RNI adequado, considerar o uso adicional de ácido acetilsalicÃlico (75 a 100 mg por via oral uma vez ao dia).
Quando o tratamento com AVK é interrompido, indica-se a terapia de ponte com heparina não fracionada ou de baixo peso molecular, exceto em pacientes com substituição por valva aórtica bicúspide (mecânica) e sem outros fatores de risco para trombose (tromboembolismo prévio, fibrilação atrial, FEVE < 35%, > 1 valva mecânica— 1).
Dicas e conselhos
A varfarina é o único anticoagulante oral adequado para a prevenção de tromboembolismo em pacientes com próteses valvares. Os anticoagulantes orais diretos são ineficazes.
Mulheres em idade reprodutiva que exigem substituição valvar e planejam ficar grávidas devem ponderar o risco teratogênico devido à varfarina quando próteses mecânicas são utilizadas e o risco de degeneração valvar acelerada quando biopróteses são utilizadas. Os riscos teratogênicos podem ser reduzidos pelo uso de heparina, em vez de varfarina, nas primeiras 12 semanas e nas 2 últimas semanas de gestação, mas o tratamento é difÃcil, há mais complicações e é necessária discussão cuidadosa antes da cirurgia.
Acompanhamento das próteses valvares
O acompanhamento da prótese valvar é facilitado pela obtenção de um ecocardiograma transtorácico (ETT) inicial pós-operatório e pela comparação com parâmetros ecocardiográficos normais (p. ex., gradientes transvalvares) para o tipo e tamanho da prótese do paciente. Se o estudo basal pós-operatório é satisfatório e não houve alteração clÃnica no intervalo, então as válvulas mecânicas não requerem ETT de rotina. Pacientes com valvas bioprotéticas devem ser submetidos à ETT de acompanhamento aos 5 e 10 anos e, então, anualmente. Pacientes com próteses valvares aórticas transcateter devem passar por ETT anual, uma vez que a durabilidade a longo prazo dessas próteses continua incerta.
Uma questão cada vez mais reconhecida é a da formação de trombos nas valvas bioprotéticas, que causam deterioração hemodinâmica. É difÃcil diagnosticar isso; muitas vezes são necessárias TC e ecocardiografia transesofágica (ETE), além de ETT. É importante distinguir a formação de trombos de outras causas de estenose valvar porque o antagonismo da vitamina K geralmente resulta em alÃvio da obstrução devido à formação de trombos.Referência sobre o tratamento
1. Otto CM, Nishimura RA, Bonow RO, et al: 2020 ACC/AHA Guideline for the Management of Patients With Valvular Heart Disease: Executive Summary: A Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Joint Committee on Clinical Practice Guidelines. Circulation 143(5):e35–e71, 2021. doi: 10.1161/CIR.0000000000000932
Por Guy P. Armstrong , MD, Waitemata District Health Board and Waitemata Cardiology, Auckland
Avaliado clinicamente jul 2022